Portaria do Ministério de Minas e Energia remove pedras no caminho da abertura completa do mercado elétrico
Um dia histórico. O Ministério de Minas e Energia publicou no Diário Oficial da União nessa quarta-feira, 28 de setembro de 2022, uma portaria que entra para a história do Brasil. Assinada pelo Ministro Adolfo Sachsida, a Portaria nº 50/2022 estende a todos os consumidores de energia elétrica atendidos em alta tensão e com demanda inferior a 500 kW o direito de escolher, a partir de janeiro de 2024, o seu fornecedor de eletricidade, se assim desejarem.
O significado é enorme e tem diversas nuances. Primeiro, trata-se da maior expansão do mercado livre de energia elétrica desde a sua criação, em 1995, beneficiando diretamente um grupo de 106 mil unidades consumidoras. Segundo, confere isonomia a esses consumidores em relação às demais indústrias e comércios atendidos também em alta tensão e que já têm o direito de escolha do fornecedor de energia. É o primeiro grande passo para a modernização do setor elétrico nacional.
O fato é que o mercado livre de energia no Brasil é um camarote VIP dentro de uma festa cara e lotada chamada setor elétrico. Acessível até então a apenas grandes consumidores industriais e comerciais, a Portaria editada pelo MME coloca, a partir de janeiro de 2024, para dentro desse ambiente comercial competitivo e moderno, milhares de indústrias e comércios, justamente aqueles responsáveis por mais de 70% dos empregos gerados no pós-pandemia em nosso país. A medida, portanto, mais do que modernizar o setor elétrico, confere um choque de racionalidade e eficiência na economia do país. Apenas para ilustrar, hoje, segundo a CCEE, apenas empresas com contas acima de R$ 140 mil podem escolher o seu fornecedor e, com a nova Portaria, consumidores com contas a partir de R$ 10 mil e atendidos em alta tensão já poderão exercer o direito de escolha.
É muito importante destacar que a abertura concedida hoje pelo MME não é fruto de uma decisão unilateral e arbitrária do Ministro Sachsida e sua equipe. Ao contrário: a decisão é fruto de um processo democrático, maduro e convergente, alinhada ao pensamento majoritário dos agentes do setor elétrico. Na Consulta Pública 131 do MME, finalizada em agosto, entre as 69 manifestações entregues isoladamente ou em conjunto, 93% opinaram favoravelmente à abertura de toda a alta tensão e 7% não se manifestaram. Dos que se manifestaram favoravelmente, 81% não apresentaram nenhuma condição e nenhum agente foi contrário à abertura, sendo que 94% dos que se manifestaram sobre o prazo concordaram com a abertura em janeiro de 2024.
É importante destacar ainda que, mais do que opinar sobre a abertura da alta tensão, diversos agentes opinaram espontaneamente sobre a abertura do mercado de energia também para a baixa tensão, até os consumidores residenciais. Das 69 contribuições entregues, 44% indicaram que apoiam a abertura do mercado de energia em baixa tensão. Desses, 93% sem indicar condicionantes.
Com a redução que deverá ser obtida nos custos com a compra de energia, há o potencial de injeção na economia de cerca de R$ 2,6 bilhões por ano, criando condições para a geração de emprego e renda para o país.
Com apenas uma página, mas decisivo, esse ato do Ministério de Minas Energia encerra uma era de morosidade que marcou os últimos anos no setor elétrico. A jornada começou em 1995, com a Lei 9.074, ainda vigente, que deu comandos para o poder concedente oferecer a todos os consumidores de energia o direito de escolher o próprio fornecedor oito anos após a sanção. Infelizmente, desde então, poucos passos significativos foram dados.
Quando puder escolher, o consumidor poderá entender, questionar e decidir o que está contratando. Poderá optar, por exemplo, por energia mais barata e renovável, duas características que se conectam no Brasil como em poucos lugares no mundo. O consumidor começará a assumir múltiplos papéis, pressionando pela modernização das empresas e do modelo regulatório e comercial do setor elétrico.
Assim, com esse ato, o Ministério de Minas e Energia reforça que o caminho é a competição e que a disputa pelo consumidor será vetor para reduzir estruturalmente os custos da energia elétrica, inclusive para aqueles que decidirem optar por permanecer no mercado cativo.
A decisão do Ministro Adolfo Sachsida, com respaldo do setor e o suporte da qualificada equipe técnica do Ministério de Minas e Energia, remove naturalmente pedras no caminho da abertura completa do mercado elétrico, sinalizando que a alta tensão é apenas um passo rumo à universalização do direito de escolha, de forma a colocar o Brasil em pé de igualdade com os mercados mais desenvolvidos do mundo.
Assim, o dia 28 de setembro de 2022 entrará para a história como o momento exato em que a reforma regulatória do setor elétrico, a última que ainda resta na infraestrutura, foi retomada. Após décadas de espera, a abertura do mercado de energia avança no Brasil, em benefício do consumidor e da população brasileira.
Rodrigo Ferreira é presidente-executivo da Associação Brasileira de Comercializadores de Energia (Abraceel).
Artigo originalmente publicado no Poder360.