2022 foi um ano muito bom para o mercado, em diversas frentes: abertura, segurança e formação de preços. Agora vamos ver o que está previsto para acontecer ao longo do ano que se inicia
Nas viradas de ano, temos o costume de fazer um balanço do ano que passou e projetar o que iremos buscar no próximo ano. Com a agenda de mercado não seria diferente. Já que o ano de 2022 trouxe muitas conquistas para o mercado livre, em suas principais frentes – abertura, segurança e formação de preços -, é oportuno fazer um panorama do que é esperado acontecer ao longo de 2023, de forma que o avanço continue.
Abertura de mercado
Neste assunto, lembramos imediatamente da Portaria MME 50/2022, que permite a migração de toda a alta tensão em janeiro de 2024. É a maior ampliação do mercado livre desde a sua criação. Logo, 2023 será um ano não só de preparação, avaliação comercial e decisões, mas também de denúncia e assinatura de contratos, para que o potencial de 106 mil unidades consumidoras possa realizar a migração.
A Portaria 50 estabeleceu que os consumidores com carga individual menor que 500 kW deverão ser representados por agente varejista na CCEE para migrarem para o mercado livre. Assim, a Aneel deve aperfeiçoar essa figura, conforme já colocado na Lei 14.120/21, o que será determinante para essa nova fase do mercado livre. O tema inclui, dentre outras questões, a desmodelagem dos consumidores varejistas inadimplentes e a agregação de dados de medição, pontos fundamentais para deslanchar o mercado varejista, e consta na Agenda Regulatória da Agência, com previsão de realização de consulta pública no primeiro semestre, para publicar o regulamento no segundo semestre de 2023.
Além disso, o Ministério também discutiu a abertura da baixa tensão na CP 137/2022. Foram 54 contribuições e 94% se mostraram favoráveis à proposta. Esse movimento foi muito importante para direcionar o debate sobre a abertura da baixa tensão, consolidando o entendimento de que não há empecilhos para a abertura de todo o mercado no horizonte dos próximos três anos, não obstante serem oportunas algumas ações de cunho igualmente modernizador, como a regulamentação do supridor de última instância e da possibilidade de separação, nas empresas de distribuição, das atividades de operação e manutenção das redes daquelas de comercialização de energia. O relatório das contribuições foi entregue à nova equipe ministerial e o mercado anseia que o novo governo publique portaria, ainda este ano, com o cronograma de abertura para a baixa tensão a partir de 2026.
Segurança de mercado
Outro destaque de 2022 foram as Consultas Públicas 11 e 10 da Aneel, que discutiram respectivamente o monitoramento da alavancagem nas operações comerciais e garantias financeiras do mercado de curto prazo (MCP). Foi consenso nas contribuições enviadas pelos agentes que eventual aperfeiçoamento nas garantias financeiras do MCP depende dos resultados que serão obtidos com o monitoramento que, por isso, deve ser discutido posteriormente.
Com esse entendimento, a área técnica da Aneel publicou nota técnica analisando exclusivamente as contribuições da CP 11, sugerindo a abertura de nova fase da consulta pública sobre monitoramento, desta vez com a proposição de minuta de resolução normativa. A consulta está prevista para acontecer no primeiro semestre, e a deliberação sobre suas propostas no segundo semestre de 2023.
A minuta de normativo sugerido prevê que um período de monitoramento preliminar, comumente chamado de “sombra”, a ser iniciado a partir do terceiro mês subsequente à publicação da nova resolução, com duração de 12 meses. Portanto, caso a implementação se inicie de fato logo no início do segundo semestre, o período sombra do monitoramento começaria por volta de outubro. A Aneel ressaltou a importância de que os dados enviados no período sombra sejam de qualidade, para análise da efetividade do monitoramento, e por isso propôs que o não envio de informações enseje o impedimento de registro de novos contratos – isso ainda será debatido na nova CP.
Também é previsto na minuta de resolução que todos os agentes, à exceção das distribuidoras, devam encaminhar à CCEE informações que permitam avaliar o seu nível de exposição nas operações realizadas e a contratadas, como o total de contratos de compra e venda e a exposição das cinco maiores contrapartes. Vale mencionar que a avaliação preliminar do mercado é que não deveriam ser enviadas informações que não sejam indicadores efetivos das operações, para evitar a manipulação de dados sensíveis que poderiam revelar estratégias comerciais dos agentes. Já o tema de garantias financeiras do MCP tem previsão de realização de consulta pública no segundo semestre de 2023 para deliberação no primeiro semestre de 2024. À primeira vista, esse prazo parece muito prematuro, dado que o período sombra do monitoramento se estenderia para 2024, e tal programação compromete a necessária avaliação do resultado desse monitoramento, que certamente deve preceder a eventual proposição de alteração da regulamentação de aporte de garantias financeiras do MCP.
Até meados de 2023 também é esperada a operacionalização da classificação de comercializadores em tipo 1 e 2, que é a distinção entre comercializadores que possuem patrimônio líquido de R$ 10 milhões (tipo 1) daqueles que possuem capital social de R$ 2 milhões (tipo 2). Os do tipo 2 possuirão limite de registro de até 30 MWmed em montes de venda mensais, estando sujeitos a não efetivação dos registros dos contratos que ultrapassarem esse limite.
Logo, a adaptação dos agentes para comprovar o capital social ou patrimônio líquido nesse primeiro ciclo da nova regra também é um movimento esperado no começo deste ano, já que os balanços patrimoniais auditados devem ser enviados para a CCEE até abril, e as classificações devem ser divulgadas em maio, para valerem a partir de junho.
Vale frisar que o mercado discordou fortemente da adoção dessa regra, pois entende que o monitoramento da alavancagem é o processo mais efetivo para garantir que os agentes operem de acordo com a sua capacidade financeira.
Formação de preços
A Resolução Normativa 843/2019 consolida os procedimentos para a programação da operação e formação do PLD, robustecendo o que chamamos de governança da formação de preços. Desde sua publicação em 2019, houve avanço no entendimento sobre a consideração da antecedência nas alterações em dados de entrada para efeitos na formação de preços, consubstanciada na Resolução CNPE 22/2021.
Logo, a revisão da REN 843 era muito aguardada pelos agentes e no final de 2022 a Aneel abriu a CP 43/2022 para discutir o tema. Foi feita uma robusta Análise de Impacto Regulatório, que buscou esclarecer conceitos relevantes associados à formação de preços. Espera-se a conclusão da análise das contribuições e fechamento da consulta pública pela área técnica da Aneel, estando sua deliberação prevista ainda para o primeiro semestre.
Além disso, os debates em torno da definição do PLD mínimo para 2023 ressaltaram a importância de aperfeiçoamentos na metodologia dos limites regulatórios do PLD. A REN 858/2019 já previa uma avaliação de resultado regulatório da norma para vigência a partir de janeiro de 2024. Logo, o mercado aguarda que esse debate aconteça ao longo de 2023, como reforçado em recente decisão da diretoria da Aneel.
Outra frente é da Cpamp, fórum que todos os anos traz novidades para os modelos de formação de preços. Em maio de 2023, é esperada consulta pública sobre duas atividades deste ciclo: a representação estocástica da geração eólica e a primeira fase do Newave híbrido (representação individualizada das usinas hidrelétricas). Assim, a deliberação sobre a implementação dessas funcionalidades nos modelos a partir de janeiro de 2024 deve acontecer até julho deste ano, conforme determina a CNPE 22/21, com período sombra no segundo semestre. A Cpamp já adiantou que o tempo de processamento do Newave híbrido está elevado, o que que pode afetar essa primeira fase de implementação prevista para janeiro de 2024.
Outro assunto importante para ficar no radar está em determinação daLei de Desestatização da Eletrobras, a 14.182/2021, que exigiu a elaboração de plano para viabilizar a recuperação dos reservatórios de regularização (PRR) do país, aprovado pela Resolução CNPE 08 em agosto de 2022. O PRR determina a revisão da recalibração dos parâmetros de aversão ao risco nos modelos com frequência anual, então é esperado que essa discussão retorne no primeiro semestre, justamente quando no último ciclo em 2022 o debate foi intenso e se buscou maior estabilidade em relação aos parâmetros escolhidos.
Além disso, outro fórum que vem tomando espaço na formação de preços é o Comitê PMO-PLD. O GT Geração Eólica prevê a deliberação sobre a implementação do modelo Weol de previsão de geração eólica no primeiro mês operativo em maio de 2023. Já o GT MMGD prevê a representação da MMGD nos modelos de forma faseada, estando a primeira fase prevista para setembro de 2023, a representação considerará apenas a MMGD existente, e a segunda fase, que considera a sua expansão futura, ficou para 2024.
O ano de 2023 mal começou e já é possível perceber que há uma agenda de trabalho relevante para dar continuidade e implementar importantes temas discutidos ao longo dos últimos anos. Desejamos que você e o mercado tenham um novo ano repleto de realizações!
Yasmin Martins e Danyelle Bemfica são, respectivamente, Coordenadora e Assessora de Energia da Abraceel.
Artigo publicado originalmente do Canal Energia.