No Brasil, existem basicamente dois modelos comerciais no mercado de energia elétrica: o mercado cativo, no qual o consumidor é obrigado a comprar energia da distribuidora; e o mercado livre, com centenas de fornecedores. Em ambos, a distribuidora entrega a energia para o consumidor. Em toda a Europa, por exemplo, todos são livres, mas aqui apenas os atendidos em alta e média tensão, conhecidos como grupo A.
O fato inconteste é que a concorrência no mercado livre beneficia o consumidor. Se no mercado cativo, o gerador concorre apenas uma única vez em 20 ou 30 anos, quando vende energia indexada à inflação para as distribuidoras, no mercado livre, com contratos pulverizados e de menor prazo, o gerador está frequentemente disputando mercado. Com os custos decrescentes das renováveis, cria-se um círculo virtuoso em prol do consumidor.
Contudo, culpam o mercado livre pelas altas tarifas do mercado cativo e “esquecem” dos reais motivos disso: contratos de longo prazo indexados à inflação; transferência para o consumidor do risco hidrológico; contratação compulsória de energias que o consumidor não quer e o país não precisa, como térmicas a carvão, e custos políticos suportados pelo consumidor, como os de Itaipu, que o obriga a custear obras de infraestrutura que nada tem a ver com energia elétrica em apenas dois Estados do Brasil.
Frequentemente, também afirmam que o consumidor livre não paga os encargos setoriais. É importante esclarecer: o consumidor livre paga absolutamente todos os encargos, inclusive todos os subsídios da CDE direcionados para o mercado cativo. Apenas uma política suportada pela CDE beneficia exclusivamente o mercado livre e está alocada no gerador renovável, que oferece desconto de 50% nas redes de distribuição e transmissão. Ainda assim, o mesmo consumidor que recebe esse benefício participa integralmente do rateio desse subsídio na CDE.
Há também discussão menos frequente, porém mais assertiva para identificar se há algum custo suportado exclusivamente pelo mercado cativo e que deveria ser rateado também pelo livre, como o custo de algum atributo de segurança energética. Essa é a boa discussão a ser feita e não culpar o mercado livre, que tem entregado energia competitiva para parte da indústria e comércio, pelo custo excessivo a que está exposto o consumidor residencial. A boa discussão também é como estender o mercado livre a todos os brasileiros, dando a eles direito de escolha e acesso ao mercado concorrencial, sem gerar novo subsídio ou desequilíbrio.
Rodrigo Ferreira é presidente executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel).
Artigo publicado originalmente no jornal O Estado de S. Paulo no dia 13/03/2024.