O monitoramento prudencial emergiu como uma ferramenta para mitigar riscos no mercado elétrico brasileiro, em resposta à crescente complexidade das operações no mercado livre de energia. Esse instrumento, implementado pela CCEE e regulamentado pela Aneel, foi concebido para reforçar a segurança e a transparência, garantindo que os agentes adotem práticas de gestão de risco alinhadas às melhores práticas internacionais.
Essa avaliação foi feita no workshop realizado pela CCEE no dia 5 de dezembro com representantes da Aneel, do Fórum das Associações do Setor Elétrico (FASE), associações setoriais, especialistas e agentes do mercado, para apresentar aprendizados obtidos após os 12 meses dos testes do “período sombra” do programa de monitoramento prudencial, encerrado em novembro. Os testes seguem vigentes até o estabelecimento das regras definitivas do programa por parte da Aneel.
Entre os principais palestrantes estavam Eduardo Rossi, Conselheiro da CCEE responsável pelo monitoramento, Rodrigo Ferreira, na função de Vice-Presidente do FASE, Alexandre Lopes, Vice-Presidente de Energia da Abraceel, e Júlio Ferraz, Assessor da Diretoria-Geral da Aneel.
Nesse contexto, foi apontado que o “período sombra”, iniciado em novembro de 2023, representou uma fase de transição importante para validar as regras e metodologias aplicadas antes da adoção definitiva do monitoramento prudencial. Durante os 12 meses de testes, os agentes do mercado foram obrigados a submeter informações detalhadas sobre suas operações financeiras e comerciais, permitindo à CCEE realizar análises mais abrangentes e identificar possíveis ajustes necessários no modelo.
Em sua apresentação, Eduardo Rossi enfatizou o diagnóstico apresentado no relatório que avalia o funcionamento dos testes, que servirá como base para discussões regulatórias futuras. Ele destacou que, ao longo do “período sombra”, 97,7% dos agentes cumpriram suas obrigações de envio de informações. Além disso, nenhum episódio de risco sistêmico foi identificado, demonstrando a robustez do modelo de monitoramento em antecipar possíveis problemas.
Rodrigo Ferreira, por sua vez, abordou a importância da segurança de mercado como um pilar fundamental para o desenvolvimento do setor elétrico. Ele destacou que mercados maduros, como os da Europa e da América do Norte, já adotam sistemas de monitoramento prudencial para garantir a estabilidade das operações. Já Júlio Ferraz reforçou que os dados coletados durante o “período sombra” serão submetidos a consulta pública, o que permitirá a participação ativa de agentes e especialistas na formulação das regras finais.
Segurança de mercado
O monitoramento prudencial foi considerado um dos pilares da segurança do mercado. A implementação dessa ferramenta surgiu da necessidade de proteger o mercado de possíveis riscos financeiros e operacionais, como inadimplências generalizadas, volatilidade nos preços e riscos de crédito. Rodrigo Ferreira, após destacar que a segurança é um elemento indispensável em qualquer mercado consolidado, afirmou que ela começa com a adoção de práticas rigorosas de gestão de dados e informações.
Ele também ressaltou que o monitoramento prudencial contribui para a criação de um ambiente de confiança, onde os agentes podem operar com maior previsibilidade e estabilidade. Durante o “período sombra”, a CCEE implementou medidas para garantir a segurança das informações coletadas, incluindo o uso de tecnologias de criptografia e computação confidencial.
O relatório do “período sombra” detalha as estratégias utilizadas para proteger os dados dos agentes. Uma das inovações foi a adoção de uma plataforma de computação confidencial, que permite o processamento de dados em ambientes criptografados. Isso garantiu que informações sensíveis, como dados financeiros e operacionais, fossem protegidas contra acessos não autorizados. Além disso, a CCEE desenvolveu processos internos para validar a integridade das informações recebidas, incluindo auditorias e análises cruzadas.
Helen Apolinário, Gerente de Monitoramento das Operações de Mercado da CCEE, destacou que o fator e alavancagem (FA) foi a métrica central adotada para medir o risco financeiro dos agentes. No entanto, ela enfatizou que a gestão de riscos vai além do FA e exige uma análise mais ampla, que considere aspectos como o impacto das cinco maiores contrapartes e o risco de contágio.
Consulta pública
A consulta pública foi outro tema do workshop, sendo destacada como a próxima etapa para a consolidação do monitoramento prudencial. Júlio Ferraz, da Aneel, enfatizou que a transparência e a participação ativa dos agentes são fundamentais para garantir que as regras finais sejam alinhadas às necessidades do mercado.
O relatório final da CCEE detalha o histórico das consultas públicas realizadas desde a concepção do monitoramento prudencial. A CP 11/2022, por exemplo, definiu as bases regulatórias do “período sombra” e permitiu aos agentes e especialistas contribuírem com sugestões e críticas. Durante o “período sombra”, a CCEE informou que promoveu mais de 120 reuniões de verificação aleatória para averiguar a veracidade das informações prestadas pelos agentes.
Arnaldo Jardim, deputado federal presente no workshop, destacou que o fortalecimento das regras existentes é suficiente para garantir a segurança do mercado, sem a necessidade de mudanças drásticas na regulação. “A institucionalidade do setor elétrico brasileiro é um de seus maiores atributos. Precisamos consolidar o que já temos, não reinventar o que já funciona”, afirmou Jardim. Essa visão foi reforçada no relatório, que propõe ajustes pontuais em áreas como a simplificação do processo de declaração para consumidores de pequeno porte.
Indicadores e aprendizados do “período sombra”
No workshop, foram apresentados indicadores dos resultados alcançados durante o “período sombra”. O fator de alavancagem (FA) foi percebido como uma métrica importante para avaliar o risco financeiro dos agentes. De acordo com o relatório, a maioria dos agentes apresentou um FA médio abaixo de 0,4, indicando baixos níveis de alavancagem. No entanto, desafios foram identificados, como a dificuldade de alguns agentes em declarar informações relacionadas às cinco maiores contrapartes. Renan Santos, representante da CCEE, explicou que essas dificuldades estavam geralmente relacionadas a problemas técnicos, e não a omissões intencionais.
Outro indicador importante foi o patrimônio líquido ajustado (PLA), que passou por ajustes metodológicos ao longo do “período sombra”. O relatório destacou que a inclusão da marcação a mercado (MtM) no cálculo do PLA gerava distorções, já que o MtM é altamente volátil. Durante o workshop, Alexandre Lopes, da Abraceel, propôs a atualização mais frequente do PLA para refletir de forma mais precisa as oscilações do MtM, como forma de evitar distorções nos indicadores financeiros.
O workshop foi encerrado com a apresentação de propostas e encaminhamentos para o futuro do monitoramento prudencial. Helen, da CCEE, destacou que as simulações realizadas durante o “período sombra” indicaram a viabilidade de simplificar as obrigações de envio para consumidores de menor porte, que apresentam baixo risco ao mercado.
O relatório detalha várias propostas de aprimoramento, incluindo mudanças no tratamento do MtM e no cálculo do PLA. Alexandre Lopes mencionou que a atualização mais frequente do PLA é uma das soluções em análise, enquanto outras propostas incluem maior rigor na análise de contrapartes e no monitoramento de consumidores varejistas.