O PL 6.407/13 na prática quebra o “quase” monopólio da Petrobras no setor e pode reduzir em até 40% o preço do insumo, com entrada de novos players e investimentos esperados de até R$ 60 bilhões
Brasília, 01/09/2020 – A Câmara dos Deputados aprovou em plenário, nesta terça-feira, o texto principal de projeto de lei (PL 6.407/13) que estabelece novo marco regulatório do gás natural no Brasil, medida que deve reduzir a burocracia para investimentos em novos gasodutos e pode aumentar a competição no setor, segundo especialistas. O novo marco estabelece abertura para um setor que até pouco tempo era dominado pela Petrobras e que o Ministro da Economia, Paulo Guedes, designa como “choque da energia barata”.
Com a decisão da estatal de deixar o negócio de distribuição – onde é sócia de 19 de um total de 26 distribuidoras – e vender sua malha de gasodutos e estruturas essenciais, o ministro Paulo Guedes, avalia que a chegada de novos concorrentes no setor pode fazer com que o preço do gás caia até 40%.
A proposta, que ainda pode ser modificada por emendas a serem votadas separadamente, altera o regime de exploração de gasodutos de concessão para autorização, o que acredita-se vai facilitar a viabilização de novos projetos, com investimentos potenciais previstos de até R$ 60 bilhões. O texto-base foi aprovado por 351 a 101 votos.
A matéria também proíbe que empresas ou grupos que atuam com transporte de gás controlem companhias com atividades também na exploração, desenvolvimento, produção, importação, carregamento e comercialização do insumo.
“É um marco importante, que reafirma o compromisso de abertura do mercado”, disse a especialista em energia do Souto Correa Advogados, Livia Amorim.
“Sem dúvida desburocratiza o processo de outorga de gasodutos”, acrescentou ela, destacando no entanto que diversos pontos do marco ainda precisarão ser detalhados em decreto ou regulamentação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
‘Novo mercado’
O presidente executivo da Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás), Augusto Salomon, reitera que o projeto precisa estimular investimentos para a construção de infraestrutura para acelerar a produção de gás natural. Para ele, isso só será assegurado com demanda firme – no caso, termoelétricas a gás natural inflexíveis, ou seja, de uso contínuo. “Com essas âncoras de consumo, incorporadas no projeto de lei, os investidores terão muito mais segurança jurídica para fazer os aportes”, disse ele.
Para o Presidente da Abraceel, Reginaldo Medeiros, a medida é fundamental e visa pontos centrais da reforma setorial, ampliando a concorrência no mercado de gás, sem subsídios. “Os benefícios serão enormes, não só para a economia em crise, mas para os milhares de desempregados durante a pandemia do Sars-Cov-2. Nossa expectativa segue a do Ministério da Economia, segundo a qual o projeto pode atrair investimentos de mais de R$ 60 bilhões ao ano e gerar mais de 4 milhões de empregos na próxima década”.
Térmicas controversas
Durante a tramitação do projeto na Câmara, alguns especialistas e empresas do setor tentaram convencer parlamentares a mudar o texto para garantir a construção de novas térmicas que assegurariam demanda por gás a ponto de viabilizar a construção de gasodutos para escoar a produção futura do insumo em campos do pré-sal. Mas o relator da matéria, deputado Laércio Oliveira (PP-SE), considera que decisão nesse sentido diz respeito à política de Estado e não deve ser tratada em projeto de lei. O parlamentar não concorda com a sugestão, que definiu como “subsídio cruzado”.
A previsão de “termelétricas âncora” no projeto – como forma de evitar que petroleiras sigam reinjetando gás nos campos do pré-sal ao invés de enviá-lo para o continente – foi intensamente defendida pela Associação Brasileira das Empresas Distribuidoras de Gás Canalizado (Abegás) e nomes como o consultor Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura.
A ideia, porém, sofreu críticas de alguns especialistas do setor elétrico, como a ex-diretora da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) Joisa Dutra, para quem contratar essas usinas poderia distorcer a competição no mercado elétrico e eventualmente gerar custos extras para os consumidores.
Quando tiver sua tramitação concluída na Câmara, o novo marco do gás ainda precisa passar pelo Senado, e, caso não seja alterado pelos senadores, segue à sanção presidencial.
*Reuters / Luciano Costa, em São Paulo; Reportagem adicional de Ricardo Brito e Maria Carolina Marcello, em Brasília