A associação estará no Enase 2011, que acontece a partir do dia 5 de outubro, no Rio de Janeiro
Alexandre Canazio, da Agência CanalEnergia, Artigos e Entrevistas
O Ambiente de Comercialização Livre corresponde a 27% do mercado de energia no país e, pelas regras atuais, tem no chamado consumidor especial sua área de expansão. Mas a limitação incomoda os agentes, que veem na concorrência uma forma de reduzir os custos com o insumo. “O mercado livre é um importante mecanismo de combate à inflação – ainda não percebido pelo Governo”, definiu Reginaldo Medeiros, presidente executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia em entrevista à Agência CanalEnergia.
A Abraceel também está preocupada com a questão da renovação das concessões do setor, que vencem a partir de 2015, principalmente, com a comercialização da energia das geradoras. “A nossa proposta é destinar a energia das usinas depreciadas em igualdade de condições ao ACL e ao ACR por meio dos leilões, com mecanismos de mercado, visando mitigar a distorção no sistema de preços dos energéticos que já é enorme no Brasil”, avaliou o executivo.
Essas e outras questões do segmento serão debatidas pela Abraceel durante o Enase 2011 – 8º Encontro Nacional dos Agentes do Setor Elétrico, que acontecerá entre os dias 5 e 6 de outubro no Hotel Sofitel, no Rio de Janeiro. O Enase é promovido pelo Grupo CanalEnergia, em parceria com a ABCE (concessionárias), Abdib (Indústria de Base), Abiape (autoprodutores), Abrace (consumidores), Abraceel (comercializadores), Abrage (geradores), Abragef (geração flexível), Abraget (geradoras termelétricas), Abrate (transmissoras), Anace (grandes consumidores), Apine (produtores independentes), Abragel (geração renovável), ABCM (carvão mineral), ABEEólica (energia eólica), Abdan (nuclear) e Cogen (cogeração). Leia abaixo a entrevista com Reginaldo Medeiros, presidente da Abraceel:
Agência CanalEnergia: A ampliação do mercado livre sempre foi defendida pela Abraceel, mas teve pouca evolução nos últimos anos. Que tipos de iniciativas o governo e o Congresso poderiam tomar para concretizar esse desejo dos agentes?
Reginaldo Medeiros: Acho que o MME está focado num único objetivo: assegurar a expansão da oferta a qualquer custo. Parece ainda assombrado com o fantasma do racionamento que contribuiu para permitir a renovação das forças políticas no Brasil, em 2002. Após quase uma década, o modelo do setor elétrico precisa evoluir para pressionar os agentes à efetiva redução de custos por meio de mecanismos de concorrência, permitindo maior liberdade de escolha pelo consumidor visando ampliar a competitividade da indústria nacional. O mercado livre é um importante mecanismo de combate à inflação – ainda não percebido pelo Governo.
O mercado permite promover ajustes na produção da indústria através da reação aos sinais de preço, em particular quando há redução da demanda e sobra de oferta, a qual pode ser escoada por meio do consumidor livre. Esta foi a importante contribuição que o mercado livre deu para a retomada da economia brasileira, após o final do racionamento em 2002 e a crise econômica de 2008. É uma situação semelhante à que vivemos hoje, pois há sobra de energia no mercado.
No longo prazo, também, o mercado livre leva a uma melhor eficiência na alocação dos recursos na economia. O mercado livre reduz preços. O mercado livre permite a expansão da oferta em bases econômicas mais sólidas. Se por um lado o mecanismo de leilão é positivo por permitir um PPA de 30 anos, por outro lado também indexa os preços da economia pelo mesmo período. É a preferência governamental pelo presente. O Governo ainda não percebeu que há melhores opções de política ao seu dispor. Tenho certeza que tanto o Governo quanto o Congresso Nacional vão analisar a questão da ampliação do mercado livre com maior profundidade. Nessa hora, simplesmente vão optar por levar os benefícios do mercado livre a uma quantidade maior de consumidores.
Agência CanalEnergia: Há dois anos, o governo colocou em audiência pública a cessão de excedentes. Mas até hoje isso ainda não andou. Como essa questão dos excedentes poderia ajudar para contratação de energia por mais longo prazo pelos consumidores?
Reginaldo Medeiros: Há duas visões sobre essa questão: a venda ou a cessão de excedente. O Governo defende que a cessão de excedente pelo consumidor livre é o mecanismo mais apropriado tendo em vista que na sua visão não há autorização legal para a venda. O mercado entende que somente a venda do excedente permite solucionar a questão, tendo em vista a natureza multilateral dos contratos e das operações da CCEE. Por esta razão, as associações ligadas ao mercado livre articularam a aprovação do PLS 402/2009, de iniciativa do senador Renato Casagrande, atual governador do Espírito Santo.
Na ocasião, o MME combateu a aprovação do PLS por incluir a ampliação da elegibilidade do mercado, apresentando como alternativa a regulamentação da matéria por meio de Decreto, o qual foi precedido da Portaria nº 73, na qual o Governo apresentou sua visão por meio de consulta pública. Assim, o Governo não permitiu a venda do excedente dos consumidores livres, ao barrar a tramitação do PLS nº 409 no Senado Federal e, ao mesmo tempo, também não editou o Decreto a que se propôs.
A comercialização de excedentes pelos consumidores é um instrumento fundamental para aumentar a liquidez do mercado e induzir a contratação de longo prazo. Cabe destacar que, apesar de não poderem vender seus excedentes, os consumidores livres já adotam a contratação de longo prazo como estratégia comercial. Segundo os dados da CCEE, cerca de 60% do volume dos contratos de consumidores livres registrados possui prazo superior a quatro anos, o que demonstra a solidez e o amadurecimento do ambiente de livre contratação.
Agência CanalEnergia: A Abraceel está lançando um certificado para os operadores do mercado. Como isso pode ajudar na qualificação dos profissionais do segmento de comercialização?
Reginaldo Medeiros: O Projeto de Certificação de operadores do mercado livre é um sucesso. Ainda estamos na metade do prazo estipulado para inscrições e já são cento e vinte candidatos à obtenção do certificado. Muitos profissionais são oriundos de fora do ambiente do mercado livre e estão utilizando a possibilidade de dispor de um diferencial profissional para ingressar no mercado de trabalho do setor elétrico.
Isto demonstra o amadurecimento do mercado de trabalho no Brasil em diversos aspectos: (a) a tentativa de obter uma diferenciação no CV ; (b) a ascensão profissional nas empresas em que atuam; (c) apoio que as empresas dão aos seus profissionais na tentativa de obter um diferencial no mercado e (d) a valorização do ensino, do conhecimento e do mérito profissional por meio da competição sem a interferência do governo e recorrer à justiça. Quando observamos a polêmica em torno da necessidade ou não de obtenção do exame obrigatório da OAB para o exercício da atividade profissional de advogado vemos que a sociedade brasileira ainda perde muito dinheiro, tempo e desperdiça impostos com o excesso de burocracia, governo e controles desnecessários.
Agência CanalEnergia: Dentro da questão das concessões, a Abraceel defende simetria de tratamento para ACL e ACR. O que a associação quer dizer com isso? Poderia explicar?
Reginaldo Medeiros: Não faz sentido destinar toda a energia originária das usinas depreciadas ao mercado cativo, pois, além de injusto, isto eliminará o mercado livre e os benefícios que traz para a economia brasileira. A nossa proposta é destinar a energia das usinas depreciadas em igualdade de condições ao ACL e ao ACR por meio dos leilões, com mecanismos de mercado, visando mitigar a distorção no sistema de preços dos energéticos que já é enorme no Brasil.
Agência CanalEnergia: Como está o andamento da criação do contrato padrão pela associação? Qual o objetivo?
Reginaldo Medeiros: O Contrato Padrão Abraceel visa reduzir os custos de transação por meio da padronização e da ampliação das transações no âmbito do mercado livre. O contrato está pronto, inclusive com um parecer jurídico muito bem fundamentado que nos dá grande conforto quanto ao seu equilíbrio no respeito aos direitos das partes à luz das regras da Aneel e da legislação setorial. Estamos submetendo este material à Aneel e à CCEE para colher as impressões tanto do órgão regulador quanto da Câmara, com o objetivo de melhorar o conteúdo produzido no âmbito da Abraceel.
A rigor, não seria necessário este crivo, pois é de livre negociação a compra e venda de energia elétrica no mercado livre brasileiro. Após recebermos estas observações, o material será postado no site da Abraceel para o uso dos interessados. Finalmente, ressaltamos que o Contrato Padrão Abraceel não é um contrato de adesão, mas um contrato que visa apenas reduzir custos e padronizar procedimentos no âmbito do mercado livre de energia, de acordo com a vontade das partes.
Agência CanalEnergia: A CCEE está estruturando um novo sistema de contabilização. Qual a importância dessa iniciativa para o aprimoramento do mercado?
Reginaldo Medeiros: Se você se refere ao novo SCL – Sistema de Contabilização e Liquidação – entendemos ser de fundamental importância para o mercado tendo em vista que o sistema atual está ultrapassado, pois foi concebido em uma outra etapa do mercado de energia elétrica. A associação vem trabalhando em conjunto com a Apine numa nova proposta de registro de contratos e garantias financeiras na CCEE com o objetivo de modelar um sistema mais adequado ao estágio atual de desenvolvimento do mercado de energia elétrica brasileiro.